Programa

28 de setembro 2022 - Universidade Lusófona

15h - Abertura
Ms. Marco Noivo (Universidade Lusófona)

15h15min - O pintor em itinerância. 
Dr. Fernando Rosa Dias (Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa)

15h30min - Artista viajante: o legado de Joaquim José Codina e José Joaquim Freire. 
Dra. Susana Gastal (Universidade Caxias do Sul)

15h45min - Filipe Branquinho em GURUÉ 15° 28‘ S 36° 59’ E“. 
Dra. Teresa Palma Rodrigues (Universidade Lusófona)

15h55min - Apontamentos sobre arte e turismo: do artista viajante ao arturista. 
Ms. Bruna Alves Lobo (Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa)

16h10min - Mostra ÍNDICE itacoatiara do ingá com presença do artista João Lobo e debate com participação do público.



Sinopses das comunicações


O pintor em itinerância. 
Vincent van Gogh, Caminho na floresta, 1887, oil on canvas, Van Gogh Museum, Amsterdam.


Na encruzilhada do século XVIII e XIX, na afirmação do espírito da viagem romântica, os pintores descobriam e valorizavam a arte da paisagem, que será uma das grandes questões dos desígnios da arte moderna, sendo questão marcante em movimentos como o naturalismo, o impressionismo ou ainda o cubismo. Procuraremos lançar alguns paralelismos e contaminações coevas entre o espírito da viagem romântica na génese da arte do turismo moderno e este espírito de deslocação, de saída do atelier, por parte dos pintores, na construção da arte moderna.

Dr. Fernando Rosa Dias (FBAUL)




Artista viajante: o legado de Joaquim José Codina e José Joaquim Freire. 


José Joaquim Freire (1760-1847). Vila de Cametá (detalhe). Aquarela, 1784


A presença de artista viajantes foi uma constante no Brasil, iniciando-se em simultâneo com a presença europeia no país continente, no início do século XVI. Em geral faziam parte de equipes multidisciplinares, que buscavam documentar flora, fauna, paisagens e gentes, nas assim denominadas expedições artísticas e científicas. No retorno dos viajantes à Europa, os textos eram publicados acompanhados de imagens ilustrativas, em geral anônimas. Não foi o caso de Joaquim José Codina (s.d.-1790) e José Joaquim Freire (1760-1847), participantes de Viagem Filosófica coordenada por Alexandre Rodrigues Ferreira, que registaram suas observações em desenhos e aquarelas. Os dois são destacados para fins da presente reflexão, tendo em vista sua produção autoral, com o objetivo de discutir a categoria artista viajante e sua importância para o incentivo às viagens além das fronteiras europeias.  

Dra. Susana Gastal (UCS)




Filipe Branquinho em GURUÉ 15° 28‘ S 36° 59’ E“. 

Filipe Branquinho, 2014, “Horizonte” (Gurué, Moçambique), 80x120cm.
 
Dos artistas moçambicanos internacionalmente conhecidos, Filipe Branquinho (n. Maputo, em 1977) é um dos nomes mais sonantes. Versátil nos meios com que trabalha - desenho, pintura, fotografia - e com interessantes obras em qualquer das áreas, é porém, na área da fotografia que o seu trabalho artístico mais se tem destacado, pelo menos em Portugal.

Proponho apresentar o seu trabalho intitulado GURUÉ 15° 28‘ S 36° 59’ E“, uma série de imagens que Branquinho realizou sobre uma região de Moçambique, localizada na província da Zambézia, conhecida pelas suas plantações de chá. Este trabalho sobre a paisagem, o território e todas as metáforas que estes temas poderão suscitar, foi exposto na Associação Kulungwana, cuja galeria se situa na Estação dos Caminhos de Ferro. Que outro lugar poderia ser mais interessante para mostrar obras que nos levam a viajar, do que uma estação de comboios?

Dra. Teresa Palma Rodrigues




Apontamentos sobre arte e turismo: do artista viajante ao arturista. 


La Décalcomanie, 1966. Oil on canvas, 81x100cm, Centre Pompidou-Paris, René Magritte (1898-1967).


Para refletirmos sobre qualquer conhecimento é necessário que conjuguemos saberes. Desde o saber científico até outros mais práticos, que adicionados numa estrutura de pensamento, contribuem para a progressão do conhecimento. Este desenvolvimento não está relacionado apenas com a capacidade intelectual formal "hiperespecializada", mas também pela habilidade de reunir e associar áreas de reflexão. Em defesa de um pensamento aberto, como vaticinado por Morin, apresentamos uma reflexão ampliada, apontando teorias e casos que revelem os contributos da relação entre arte e turismo, como dois sistemas complexos através dos seus protagonistas: o artista viajante do século XVIII, que viajava para encontrar com os grandes mestres da pintura e escultura até o atual arturista, um neologismo apontado pela artista Leonor Antunes para o artista viajante contemporâneo inserido no contexto turístico.

Ms. Bruna Alves Lobo (FBAUL)





Mostra fotográfica ÍNDICE itacoatiara do ingá 

Índice itacoatiara do ingá, João Lobo.



A Pedra do Ingá contada em quatro atos

Curadoria: Sofia marçal

A exposição ÍNDICE itacoatiara do ingá, do artista e investigador João Lobo, parte do monumento ITACOATIARA[1]ou Pedra do Ingá,[2] onde se encontram gravadas gravuras pré-históricas. O artista fotografou as formas esculpidas no monolítico num contexto estritamente artístico de índices pré-históricos.

É importante dar a conhecer a cultura, a história e difundi-las, torna-las globais sem as desvirtuar. As fotografias aqui apresentadas são disso testemunho e remetem-nos para a necessidade de o artista registar e construir um trabalho circunscrito num pensamento direcionado para a problemática histórica e da sua representação artística.

Nestes trabalhos fotográficos João Lobo dialoga com indícios através de gradações luminosas e cromáticas captadas pela câmara. Os traços e registos que se encontram na pedra ganham importância sobre o olhar do fotógrafo. “ O mundo visível é novamente um mundo de traços onde o invisível recebe o encargo de impressionar-se no visível.”[3] Nessa circunstância foi possível fazer o cruzamento entre determinados registos gráficos e criarem-se novas leituras.

O artista opta por conceber uma narrativa expositiva em quatro actos. A exposição inicia-se com a apresentação de duas peças de madeira envelhecidas, peças que retratam as pedras e nos remetem para o passado, para a pré-histórica, para as gravuras rupestres. No seguimento, três molduras antigas com fotografias impressas em tela, molduras quebradas e sujas intencionalmente que dão a impressão que foram encontradas por acaso. No terceiro acto, cinco peças impressas em papel normal, representando a atualidade. Por fim, cinco peças de acrílico com fotografias em perspectiva tridimensional que nos transportam para o futuro. “As fotos, que brincam com a escala do mundo, são também reduzidas, ampliadas, recortadas, retocadas, adaptadas, adulteradas. Elas envelhecem, afetadas pelas mazelas habituais dos objetos

de papel; desaparecem; tornam-se valiosas e são vendidas e compradas; são reproduzidas. Fotos, que enfeixam o mundo, parecem solicitar que as enfeixemos também. São afixadas em álbuns, emolduradas e expostas em mesas, pregadas em paredes, projetadas como diapositivos. jornais e revistas as publicam; a polícia as dispõe em ordem alfabética; os museus as expõem; os editores as compilam.”[4] As várias formas de apresentação destes trabalhos conforme a época que querem representar, confere-lhes um estatuto de guardiãs da veracidade artística.

Citando João Lobo, “assinalamos as questões fundamentais da história da arte pré-histórica, sobre representação e abstração que essa proposta artística pode anunciar. As imagens de ÍNDICE itacoatiara do ingá possuem uma perspetiva puramente artística do monumento arqueológico. Sendo assim, promove a discussão sobre a transformação de artefactos arqueológicos em criações artísticas, sobretudo de sítios pré-históricos. Pois, quando o fotógrafo desenvolve uma criação artística a partir de algo que já está criado, pode incorrer em apenas retratar a realidade.” Em direção oposta ao realismo social, João Lobo preferiu o sonho e o mundo de formas voláteis que a luz às vezes sugere, mesmo por vezes sendo onírica, com a dimensão ilusória que se projeta sobre o real e que leva à procura de interfaces entre o que existe e o que se pretende que exista.

Estamos perante uma exposição com trabalhos fotográficos artístico-documentais. A fotografia documental, além de difusora de informações, é também provedora de prazer estético e formadora de opinião. João Lobo procura nas suas obras recuperar, através dos detalhes de alguns signos desse grande painel de gravura, a magia que certamente envolvia os cultos lá praticados. Para Jacques Aumont a grande revolução fotográfica era “fixar o tempo com o espaço.”[5] Aqui, no museu o artista pretende valorizar o património cultural brasileiro e reposicionar este importante monumento monolítico na atenção do poder governamental e dos agentes culturais.

Esta exposição também pretende celebrar os duzentos anos de independência do Brasil.

 


[1] Itacoatiara é um vocábulo indígena que significa pedra pintada, pedra escrita. Procede do tupi itá: pedra e coatiara: pintado, gravado, escrito, esculpido.

[2] A pedra do Ingá mede 24 x 3m, é composta por rocha metamórfica coberta por inscrições antigas. Está localizada no Sítio Arqueológico das Itacoatiaras na cidade brasileira de Ingá. Apesar de ser reconhecido pelo Instituto do Património Histórico Artístico e Natural (IPHAN) do Brasil em 1944, esse Sítio é subaproveitado, pois ainda não conseguiu aceder e permanecer conservado na sociedade como ativo cultural. João Batista Nascimento Ribeiro, in: A geoconservação e os aspectos do geoturismo do sítio arqueológico do Ingá: Um estudo das Pedras Itacoatiaras. Trabalho de Conclusão de Curso de Geografia na Universidade Estadual da Paraíba (UEPB) e Luciana Arruda Falcão, Amada Gama Tavares e Ilana Kiyotani in: Arqueoturismo: repensando o turismo nas Itacoatiaras do Ingá – PB.

[3] Rosalind Krauss, in: O fotográfico, p.30.

[4] Susan Sontag, in: Sobre fotografia, p.15.

[5] Jacques Aumont, in: O olho interminável, p. 80.